O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados suspendeu a reunião desta terça-feira (1º) antes que fosse votado o relatório que pede a continuidade do processo de cassação do mandato do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Após mais de três horas de debates, o presidente da comissão, José Carlos Araújo anunciou a suspensão em razão do início das votações no plenário.
Araújo disse que pretende retomar a votação do relatório após o encerramento das atividades no plenário. A reunião ocorreu depois de encerrada a fase de discussão do parecer do relator, Marcos Rogério (PDT-RO), que pede a continuidade das investigações. “Hoje houve um avanço”, disse o deputado. Ninguém esperava que a discussão fosse encerrada e que se votasse ainda hoje o parecer, destacou Araújo.
Contudo, antes de conseguir colocar o parecer em votação, será preciso vencer quatro requerimentos que pedem o adiamento da votação, por cinco, quatro, três e dois dias, respectivamente. Segundo o presidente do conselho, as manobras transformaram a análise da admissibilidade da representação protocolada pelo PSOL e pela Rede em um processo “tumultuado”. “[É] um processo que está julgando o presidente da Câmara, que tem poderes nesta Casa, que tem poderes de manobra, e nós nos submetemos a tudo o que aconteceu”, afirmou Araújo. Ele criticou a decisão do vice-presidente da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), que praticamente zerou o processo na comissão.
Desde o início da discussão do relatório, na semana passada, mais de 20 deputados se inscreveram para o debate. Em vários depoimentos, os parlamentares criticaram as manobras para protelar o andamento das investigações. “Resta evidente, ao longo das sessões, já temos mais de 100 dias corridos desse processo, e não quero dar coro aos que pretendem protelar, de maneira renitente, [a votação]” destacou o deputado Leo de Brito (PT-AC). “Não vejo motivo para essas obstruções porque estamos votando somente a admissibilidade do nosso processo”, afirmou.
O líder do PSOL, Ivan Valente (SP), afirmou que as manobras protelatórias são inúteis e só desgastam a imagem de Cunha. “O Conselho de Ética ainda não começou o processo. Hoje votaremos a admissibilidade, e isso é o mínimo que deveríamos ter feito para não desmoralizar esse conselho e o Congresso Nacional”, afirmou. O PSOL é o partido que, ao lado da Rede, representou contra Cunha no Conselho de Ética,
Na representação, Cunha é acusado de mentir em depoimento na extinta Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras sobre a existência de contas no exterior. A acusação também se baseia em delações premiadas feitas no âmbito da Operação Lava Jato. Cunha afirma que é inocente e que não cometeu nenhuma irregularidade.
Aliados criticam condenação antecipada
Aliados de Cunha defenderam as chamadas manobras protelatórias e criticaram o que chamam de condenação antecipada do presidente da Casa. “O que estamos fazendo aqui é o que permite ser feito pelo regimento do conselho para que o processo transcorra da forma mais transparente possível”, disse o deputado André Moura (PSC-CE). “O que não se pode é se discutir só na ordem politica. Alguns membros do conselho querem politizar e pedir admissibilidade do processo”, acrescentou.
A defesa de Cunha pediu o arquivamento do procedimento, classificando-o de “natimorto”. De acordo com o advogado Marcelo Nobre, a análise pendente de um recurso na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) tornará nula a admissibilidade do processo.“Esse recurso precisa ser admitido antes. Não podemos aceitar que este processo continue sem decidir sobre um recurso que o fere de morte”, disse Nobre, referindo-se ao pedido de concessão de 10 dias de defesa prévia antes da admissibilidade.
O líder do PSOL afirmou que, com a admissibilidade do processo, será possível o contraditório, bem como o direito à ampla defesa. “Ele [Cunha] precisa vir aqui explicar todas as acusações e os diversos processos que pesam sobre ele e o que foi representado no conselho e no relatório [do deputado Marcos Rogério]”, defendeu Valente.
Amanhã (2), o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará o pedido da Procuradoria-Geral da República sobre a acusação de que Cunha recebeu propina no valor de US$ 5 milhões em contratos de navios-sonda da Petrobras. Se o pedido for aceito, Cunha se tornará réu e responderá pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
O relator Marcos Rogério defendeu a continuidade das investigações com o argumento de que o papel do colegiado é distinto do da Justiça. “Não julgamos aqui se o parlamentar cometeu crime na esfera penal. Nosso papel é apurar se tais comportamentos são compatíveis com o decoro parlamentar, e isso só será possível fazer na outra fase.” Marcos Rogério afirmou que respeitará o devido processo legal: “não condenarei sem provas, nem causarei ofensa aos direitos e garantias individuais. Terei respeito ao contraditório”. Luciano Nascimento – Repórter da Agência Brasil
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