Defesa do ex-presidente troca argumentos jurídicos por discurso político, enquanto aposta em 2026 e ignora a gravidade dos ataques à democracia.
Roberto Gutierrez – A defesa de Jair Bolsonaro abandonou a argumentação técnico-jurídica para entrar definitivamente no terreno político. O foco agora é outro: apostar em uma possível virada de cenário em 2026. Os advogados têm o direito de tentar o que acharem melhor, mas o que se viu nas alegações finais foi a repetição de teses já esgotadas.
Velhos argumentos, causas superadas
Mais uma vez, pediram a suspensão do ministro Alexandre de Moraes — algo que foi discutido e rejeitado em todas as fases do processo. Essa questão já havia sido resolvida no curso do julgamento e, portanto, não cabe em embargos de declaração.
Durante o julgamento, a defesa também reclamou do excesso de documentos e da falta de tempo para analisá-los. São argumentos que soam mais como tentativa de prolongar o processo do que de enfrentá-lo com consistência.
A aposta na política de 2026
Nos bastidores, a estratégia é clara: ganhar tempo até que o clima político mude. A esperança é de que, com um eventual governo de oposição em 2026, venha um indulto ou uma anistia. Mas é importante lembrar que, neste caso, ambos seriam inconstitucionais.
Deixar sem punição quem atentou contra a democracia é permitir que a democracia continue sob risco. Quem defende anistia a Bolsonaro — por conveniência, por cálculo político ou por convicção ideológica — ainda não compreendeu a gravidade do que aconteceu, ou simplesmente continua flertando com o autoritarismo.
Segunda Turma, apenas um sonho
Muito se comenta que a “turma de Fux”, a Segunda Turma do Supremo, poderia no futuro tentar aliviar a situação de Bolsonaro e de alguns militares. Mas não há espaço real para essa expectativa. Questões de ordem constitucional terão que ser decididas pelo Plenário, e ali a tendência é de firmeza institucional.
Entre a saúde e a República
A única possibilidade visível para Bolsonaro, diante da idade e do estado de saúde, seria uma prisão domiciliar. Mas é preciso dizer: o que está em jogo agora não é o corpo de um homem, e sim a saúde da própria República.
Deixar impune quem atacou o sistema democrático é abrir caminho para que o mesmo ataque volte a acontecer — talvez com mais força, talvez com mais apoio.
*Roberto Gutierrez é jornalista. Na comunicação desde outubro de 1976, passou por todas as mídias e há quase três décadas é editorialista e analista político.
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