Flavio Barra comandava o caixa 2 na Andrade Gutierrez

Alerta. Executivos da Andrade Gutierrez tentaram se livrar de penas mais duras na Lava Jato com acordos de delação agora sob risco
Alerta. Executivos da Andrade Gutierrez tentaram se livrar de penas mais duras na Lava Jato com acordos de delação agora sob risco

Mineiro de Varginha, no Sul de Minas, o engenheiro Flavio David Barra, 54, é apontado pelo Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro como chefe principal do caixa 2 geral da Andrade Gutierrez, onde eram reunidos todos os recursos não contabilizados, depois distribuídos em dinheiro vivo a agentes públicos e políticos. Foi por meio desse esquema que a construtora, irrigou a rede de pagamento de propina em diversas obras no país.

No depoimento prestado aos procuradores do Rio de Janeiro, em 24 de junho, o então presidente da AG Energia, empresa da Andrade Gutierrez, disse que, desde 2007, a construtora possuía o caixa 2 para pagamento de propina “em relação a várias obras, inclusive a de Angra 3”, revelou na delação.

Não se sabe se Barra, por ter papel central no esquema de corrupção da Andrade Gutierrez, será implicado em outras delações da Odebrecht. Caso isso ocorra, a Justiça Federal pode suspender os benefícios obtidos por ele e pelo ex-presidente da Andrade Gutierrez Otávio Marques de Azevedo.

Ambos já foram condenados em setembro pela Justiça Federal, com sentença atenuada após a delação premiada. Flavio Barra foi condenado a 15 anos de prisão domiciliar pelos crimes de corrupção ativa, lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa. No primeiro ano, terá de ser monitorado por tornozeleira eletrônica. Em seguida, a pena progride para o regime semiaberto diferenciado pelo prazo de dez meses. Depois deste período, ele segue para o regime aberto diferenciado, pelo período de dois anos, que deverá ser cumprido juntamente com a prestação de serviços comunitários à razão de 20 horas mensais em local a ser definido pela Justiça.

Formado em engenharia civil pela PUC Minas, em 1987, Flavio David Barra entrou na Andrade Gutierrez dois anos antes, ainda como estagiário. Segundo ele mesmo contou aos investigadores durante o depoimento, passou por diversos cargos dentro da construtora e, só após dez anos, chegou ao cargo de engenheiro-chefe, sendo responsável por uma obra específica da empresa. Passou então a atuar na área comercial da AG no setor de obras urbanas.

Com o tempo, foi ampliando sua área de atuação até alcançar, em 2003, a superintendência de todas as obras viárias da construtora em São Paulo. Entre 2006 e 2007, passou a atuar também na área de obras viárias na região Sul. Em 2008, chegou ao cargo de diretor da unidade de negócios de energia da construtora.

Lavagem. Foi nessa época que o engenheiro civil começou a operar o caixa 2 unificado da empresa. Barra contou que foi procurado pelo empresário Samir Assad com a proposta de superfaturar serviços contratados nas empresas fantasmas, gerando recurso em espécie não contabilizado.

Segundo o executivo mineiro, a gestão do caixa 2 da Andrade era feito pelo então diretor financeiro Ricardo Campolina, já falecido.

Campeã

Legenda. A empresa-fantasma emitiu o maior número de notas fiscais frias à Andrade Gutierrez. Foram 168 repasses, que geraram R$ 126,6 milhões para o caixa 2 da construtora mineira.

CAIXA 2 UNIFICADO

Funcionamento. Flavio Barra contratava serviços superfaturados das empresa- fantasma de Samir Assad, como locação de máquinas, equipamentos e aeronaves, que, na verdade, não existiram.

Maquiagem. A construtora pagava pelos serviços não prestados e, em troca, Samir Assad emitia à Andrade Gutierrez notas fiscais frias. O acordo definia que 80% dos valores pagos nos contratos fictícios seriam devolvidos em espécie à Andrade. O recebimento do dinheiro devolvido por Assad era de responsabilidade do gerente de planejamento financeiro Fernando Vasconcellos.

ACORDO

Delator envolveu ex-ministros

Em sua delação premiada, colhida em junho por procuradores do Ministério Público do Rio, Flavio Barra citou importantes figuras do cenário político. Em depoimento, o ex-presidente da Andrade Gutierrez Energia confirmou repasses de propinas no valor de R$ 15 milhões ao ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, feitos por contratos fictícios.

Ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Barra disse que repassou R$ 5,6 milhões ao senador Edison Lobão (PMDB-MA), ex-ministro de Minas e Energia do governo Dilma, sobre as obras da Usina de Angra 3 e da Usina de Belo Monte.

De acordo com o delator, houve divisão de percentual de propina sobre os contratos de Angra 3: para o PMDB 2%, para o PT 1% e, em torno de 1,5%, entre executivos da Eletronuclear. Barra relatou que “existiam dois interlocutores principais”, Edison Lobão pelo PMDB e o ex-tesoureiro João Vaccari pelo PT, “mas que manteve contato ainda com o senador Romero Jucá (PMDB-RR)”. (AD)

DERROTA DE AÉCIO

‘Voto em SP, que me deu orgulho’, disse Barra após eleições

Antes de serem presos e condenados pelas investigações da Lava Jato, a cúpula de executivos da Andrade Gutierrez torceu, e muito, pela eleição do senador Aécio Neves (PSDB) à Presidência da República em 2014. Foi o que revelou uma troca de mensagens por WhatsApp de um grupo de diretores da construtora.

As informações fazem parte de um conjunto de documentos apreendidos pela Lava Jato e constam do celular de Elton Negrão de Azevedo Júnior, que deixou a empresa após ser preso e denunciado por corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. O ex-executivo fez parte do grupo de diretores que concordou com o esquema de lavagem de dinheiro sugerido pelo empresário Samir Assad na formação do caixa 2.

As conversas mostram piadas, correntes e petições online contra a então presidente Dilma (PT), que disputava o segundo turno com o tucano mineiro. “Aqui em BH (Belo Horizonte), muita gente está gritando dos aptos: Fora Dilma!!”, escreveu Negrão.

Após a votação do segundo turno, o grupo trocou comentários favoráveis a Aécio, mostrando a torcida pelo tucano. “Os números dos candidatos ligados ao Aécio estão muito bem. Goiás, DF e RS estão fechando acima da média”, diz Anuar Caram, presidente da AG Público Brasil.

Em outro momento, o boato de que Aécio teria vencido e que seus aliados estariam indo para Belo Horizonte domina a troca de mensagens. “Acho que vai dar. Acabei de saber que FHC está indo a BH”, comenta Caram. Em seguida, ele diz que “está todo mundo vindo para BH”.

Após o resultado das apurações, a decepção geral: “Vergonha de ser mineiro!”, reclama um deles. Flavio Barra, então, afirma: “nem sou mais… voto em SP, que me deu orgulho!”. Um ano depois, Flavio Barra foi preso por abastecer o caixa 2 da empreiteira. (AD)

Residência

Moema. Apesar de mineiro, Flavio Barra mora em São Paulo, em Moema, bairro nobre da capital paulistana. É no charmoso endereço que o ex-executivo cumpre prisão domiciliar.

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