Entre pressões silenciosas, derrotas estratégicas e cálculos frios, Brasília transforma a anistia em miragem, enquanto a prisão rende mais do que qualquer absolvição. Coluna do Gutierrez
Por Roberto Gutierrez – “Anistia ampla e restrita.” A expressão virou senha de acesso nas redes e nas conversas de bastidores em Brasília. De repente, ressuscitou-se um tema que muitos partidos gostariam de manter trancado na gaveta mais funda do Congresso. Mas o PL, em diálogo íntimo com a família Bolsonaro, decidiu repaginar a pauta e recolocá-la em circulação.
O cálculo é simples: a maioria dos partidos não quer tocar nesse vespeiro. Para eles, anistia é assunto radioativo. Arthur Lira, sempre ele, com o pragmatismo de quem sabe para onde o vento sopra, acena com algo mais suave: dosemetria, ou seja, redução de penas. Na prática, uma porta de saída mais rápida para Bolsonaro, rumo ao regime aberto.
O problema é que o projeto de anistia, tal como está, nasce morto. Passaria apertado na Câmara, mas seria fuzilado no Senado. E, se por milagre sobrevivesse aos senadores, encontraria no STF sua lápide constitucional. A chance de isso ser pautado de verdade? Ínfima. Para muitos, inexistente.
Clima azedo no Congresso
Enquanto isso, o governo assiste, impotente, ao ambiente se deteriorar no Legislativo. Alcolumbre e Jader Mota ampliam distância. As brigas públicas, que hoje estão quase semanais, empurram projetos prioritários do Executivo para uma fila que ninguém quer organizar.
A tensão entre Hugo Motta e Lindbergh Farias, que se arrasta desde a aprovação da PEC da Segurança Pública, serve de retrato desse Congresso desalinhado. A PEC saiu o oposto do que o governo desejava. E quando o governo não controla a pauta, a oposição ganha terreno para avançar a sua. A anistia incluída.
Fator Bolsonaro e o jogo do Centrão
Nos cálculos frios do Centrão, tornar Bolsonaro elegível novamente seria um erro estratégico. O interesse real é outro: mantê-lo preso, transformá-lo em mártir e faturar votos com o candidato que o Centrão escolher. O que admitem negociar, e isso sim com gosto,— é redução de pena, jamais anistia total.
Some-se a isso a possibilidade, cada vez mais comentada nos corredores, de que Alexandre de Moraes decrete a prisão condenatória de Bolsonaro. A partir desse ponto, abre-se oficialmente a discussão sobre dosimetria. E a anistia? Só entraria como suspiro político, um suspiro que ninguém quer assumir oficialmente.
Guerra fria entre Messias e Alcolumbre
Se a política fosse um tabuleiro de xadrez, a carta enviada por Jorge Messias louvando Alcolumbre seria o cavalo tentando entrar pela diagonal: elegante, mas fora do padrão esperado. A carta não teve resposta. E o silêncio, no Senado, fala mais alto do que uma coletiva de imprensa.
A memória institucional também cobra sua fatura. André Mendonça, indicado por Bolsonaro ao STF, ficou cinco meses cozinhando em banho-maria nas mãos de Alcolumbre, e não de Pacheco. Bolsonaro não entendeu a coreografia, comprou briga errada, retirou cargos do senador e teve de engolir o orgulho. Resultado: tudo voltou ao normal, e Mendonça foi aprovado. Mas o ressentimento ficou.
Hoje entende-se melhor por que Alcolumbre quer Pacheco sentado na cadeira vaga do STF. Não é ideologia, não é técnica: é memória.
Indicação nas mãos de quem?
Embora o Senado faça pose, a Constituição é clara: indicar ministro para o STF é prerrogativa do presidente da República. Ao Senado, cabe aprovar ou não. Mas o ambiente político atual é tão desfavorável que o governo percebeu que talvez seja melhor empurrar a sabatina de Jorge Messias para 2026.
Só que Alcolumbre pensa diferente. E tudo indica que ele tentará pautar ainda este ano – e no fio de navalha.
Para finalizar…
Seja pela anistia improvável, pela dosemetria provável ou pelo impasse na indicação ao STF, o Brasil segue governado pelo que não acontece, pelo que quase aconteceu e pelo que alguém ameaça fazer.
Em Brasília, o silêncio costuma dizer mais que o discurso.
E nesta semana, ele está ensurdecedor.
*Roberto Gutierrez é jornalista. Na comunicação desde outubro de 1976, passou por todas as mídias e há quase três décadas é editorialista e analista político.
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