Brasil do fundamentalismo rumo a uma ‘aiatoção’ evangélica

Há quem ainda trate o avanço do fundamentalismo evangélico no Brasil como um fenômeno religioso. Não é. É um projeto de poder – e dos mais ambiciosos.

*Roberto Gutierrez – Há algo de bíblico, no pior sentido, no avanço do fundamentalismo evangélico no Brasil. Não são apenas templos que se multiplicam; são certezas dogmáticas que se instalam como muros de concreto na cabeça de milhões. A fé, que deveria libertar, virou corrente. E muitos pastores, que deveriam ser guias espirituais, hoje desfilam como generais de um exército pronto para marchar sobre o Estado.

 

Ambição

Querem tudo: querem legislar, querem julgar, querem normatizar. O projeto mais recente é quase uma parábola: tribunais eleitorais “terrivelmente evangélicos”. Como se a democracia precisasse ser ungida a óleo para funcionar. Como se a Constituição fosse um folheto de culto.

 

Metamorfose da consciência

A teologia virou arma política. A fé virou senha de obediência. E a democracia, para essa turma, virou apenas um detalhe inconveniente que precisa ser domado, quando não substituído. O novo fetiche é “tribunais evangélicos eleitorais”. Querem validar a própria causa com carimbos divinos. É a receita perfeita para fabricar uma república teocrática com sabor tropical: a República dos Aiatolás Pastorais.

 

Campo fértil…

A educação falhou, e no seu lugar brotou um campo fértil para o fanatismo religioso, irrigado por fake news e colhido por líderes que misturam apocalipse com ambição. Nove em cada dez pastores já embarcaram no combo da perversidade moral. São generalíssimos de um rebanho que confunde fé com ordem unida.

..para o fundamentalismo

O Brasil, analfabeto por opção de suas elites, abriu o flanco. Quanto menos educação, mais terreno para o fanatismo. E enquanto os militares hesitaram entre o golpe imaginário e a aposentadoria, os pastores avançam com método. Noventa por cento estão alinhados ao pacote da perversidade moral travestida de virtude. Apenas uma minoria tímida ousa discordar.

 

Incrível ver boa parte da classe política sendo refém dessa opinião cujo prêmio eleitoral é não ser demonizado.

2060 poderá ser terrível

E é aqui que o país corre perigo. Israel, com menos de 20% de fundamentalistas, entregou décadas de poder a Netanyahu. No Brasil, quando a maioria evangélica ultrapassar os 50%, quem vai conter a tentação teocrática?

 

É preciso perceber…

…A questão não é a fé – é o uso da fé como instrumento para restringir o espaço democrático. Se a sociedade brasileira não compreender a urgência desse debate, poderá assistir ao surgimento de um Estado onde dogmas religiosos se sobrepõem à Constituição. E, uma vez instaurado, um regime teocrático raramente devolve o poder que conquista.

*Roberto Gutierrez é jornalista. Na comunicação desde outubro de 1976, passou por todas as mídias e há quase três décadas é editorialista e analista político.

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