Memória – História da Colonização de Rondônia começa em Ouro Preto, os primeiros passos ao Estado Material escrito pelo Jornalista Roberto Gutierrez artigo publicado em 2009.
Ao ver que praticamente 40 anos de pesquisa foram colocadas ao chão pela força do machado e da motosserra, é possível perceber que a explosão demográfica, somado a ignorância e a falta de planejamento ameaça a pesquisa. Trata-se da ação de vândalos que derrubou lavouras de cacau da Ceplac em Ouro Preto. Um marco da história da colonização, no entanto, contar um pouco da história de Ouro Preto do Oeste torna-se um exercício literário complicado quando se faz parte dos acontecimentos que surgiram a partir de 1970 com a instalação do Incra no Projeto Integrado de colonização Ouro Preto (PICOP), assim, sem pudor de escrever na primeira pessoa do singular – contrariando todos os manuais de redação – passo a contar sobre algumas passagens as quais contribuíram para que Rondônia saísse da condição de colônia de seringueiros para a condição de Estado – entre os mais promissores do País.
Há duas semanas recebi umas fotos antigas do arquivo de Assis Canuto às quais vi retalhos da história registrados na memória – uma delas, ainda da plantação das mudas de cacau na estação experimental da Ceplac, que foi coordenado por Frederico Álvares-Affonso. As fotos também levaram à escola Isolada Doutor Joaquim de Lima Avelino na qual estudei. No entanto, isso não tem importância noticiosa, são apenas lembranças. Importantes são os heróis anônimos que morreram na luta por garantir um pedaço de terra onde os inimigos não eram latifundiários, mas as doenças tropicais como a malária, os acidentes por conta das derrubadas – muitos morreram esmagados por árvores em derrubadas – famílias inteiras dizimadas pela malária – uma história de muitos órfãos que hoje são avós.
O ponto comercial mais importante era a cantina do Capitão Silvo de Farias, logo na entrada de Ouro Preto. Ali eram distribuídos os mantimentos para as equipes que abriram as primeiras estradas vicinais. Eram dois acampamentos: do Machado e do Miache. Neles havia homens como Zefirino, Caribamba, Ezequiel, Quito, Capixaba, Agenor Nogueira da Rocha, Comara e tantos mais que minha memória de um garoto de 13 anos não conseguiu guardar. A primeira linha a ser aberta foi a Linha 22. Nela morava uma figura ilustre da política – João Dias, que chegou à condição de deputado.
Enquanto as linhas vicinais eram abertas – 1970 – o Incra, comandado por Assis Canuto, estava responsável pela missão de assentá-los em lotes de 100 hectares. Havia nomes que trabalham com Canuto como Ademar da Costa Sales, Praça Ferreira, Doutor Julimar Militão, Morluf, Augustinho Peniche, Nunoy Itsumi, Antônio Cunha (os dois últimos enfermeiros), Eustáquio, Bosco, Paulo Brandão, os guardas Florestais Célio, Amaurino, Soares (empresário em Jaru) e Peniche. Técnicos agrícolas como Francisco Sales Duarte de Azevedo, Genivaldo Souza, Demerval Baiano da Ceplac, Professor Junqueira – que implantou o café em Rondônia; Itabaiana, Adalberto da Ceplac , Barbosa, ‘Seo’ Oliveira… Tem ainda motoristas como Nilo, Nelson Baracho, Raimundo da Cruz Teixeira, Agenor da Rocha, Alemão Preto, Vicentão, Manezinho Rocha, Zezé, Badé, Chico Parafuso que era tratorista e tem mais gente, muito mais. Parte desses personagens citados já morreu e o restante está aposentado – todos os citados chegaram a Ouro Preto de 1970 a 1973.
Vila Sapolândia em 1972; na parte superior, o setor comercial de Ouro Preto que recém-começava com 12 casasAlunos da Escola Isolada Doutor Joaquim de Lima Avelino em 1972 no projeto de colonização Ouro Preto
Na foto estão Vanderlei Juquita (morreu na década de 80) Roberto Gutierrez ao centro (o jornalista que escreve este site) e Hamilton Soares Lenk um pouco atrás.
Personagens do início da colonização
ma casa de madeira à beira da BR-364, próximo a um pé de cajá, foi o local no qual funcionou o primeiro escritório do Incra em Ouro Preto. Aliás, próximo dali, a três quilômetros no sentido da Vila de Rondônia (Ji-Paraná), precisamente enfrente ao morro da Embratel (parque Chico Mendes), estava a razão do nome dado à localidade: o seringal Ouro Preto, pertencente a Vicente Saborá Cavalcante. Ele era casado com dona Nami, que ficou viúva no início da década de 70. Dona Nami acabou morrendo há pelo menos cinco anos em Ouro Preto.
A sede do Incra à beira da BR funcionou por um período pequeno. O executor do Incra, Assis Canuto, mandou construir uma sede nova onde é hoje a Avenida Capitão Silvio de Farias. Trezentos metros mais abaixo da nova sede, que na época era no meio da mata, foi construída a casa do Canuto, que na época era solteiro. No local mora atualmente Expedito Rafael – primeiro prefeito eleito de Ouro Preto cuja vitória dele, pela extinta Arena, foi orquestrada pelo ex-governador Jorge Teixeira de Oliveira. O episódio merece um capítulo à parte. Mas, como ia dizendo, a casa na qual funcionou a primeira sede do Incra, não ficou abandonada. Nela foram morar duas famílias: Nelson Baracho, motorista e ex-soldado da borracha; e o manauara Alcides da Silva, contabilista. Alcides era casado com dona Lucimar. Tinham dois filhos: Geraldo e Marilene. Sete e cinco anos, respectivamente. Baracho, que era um gozador de marca maior, era casado com Maria e tinha uma filha com ela: Núbia, que tinha um ano na época.
Baracho deu nome aos bairros
Baixinho, apenas três dedos na mão direita, nato contador de anedotas e bebia todas com ou sem limão. Assim era Nelson Baracho, ex-soldado da borracha que batizou a primeira vila do Incra de Sapolândia. O bairro onde moravam os técnicos agrícolas, próximo ao campo de futebol do Incra, ele batizou de Chifrolândia. (Não me perguntem o porquê disso!). Já a terceira e última vila do Incra, que passou a ser construída a partir de 1973, da avenida Daniel Comboni se estendendo até ao igarapé Ouro Preto, chamava-se Toca-Tapas. Teve uma época que a mulherada brigava mesmo. Tapas e pauladas. Elas se juntavam para lavar roupas à beira do igarapé e a fofoca de que o marido de uma estava pegando a amiga da outra acabava em quebra-pau.
Veja os nomes das criaturas que eram alvo da ciumeira da mulherada: Canga, Jabiraca, Zé Comedor, Luiz Boracheiro e Vanuza. Zé Comedor, coitado, tinha esse apelido justamente porque não pegava ninguém – a não ser a Júlia Cacete do Cai N’água na Vila de Rondônia (hoje Ji-Paraná). Vanusa pegou esse apelido porque era loiro e tinha o cabelo grande. Jabiraca era uma espécie de Iguita da época, embora não sendo goleiro, jogava demais. Canga tinha as pernas tortas igual ao do Garrincha. Ele também protagonizou o primeiro caso de cobrança armada – claro, ele era o devedor e, o cobrador, administrava o supermercado da CiraPicop. Luiz Borracheiro foi expulso de Rondônia. O cara era gente boa, mas sempre se envolvia em confusão.
Vista aérea da terceira vila do Incra – antigo bairro Toca-Tapas. Na parte inferior da foto é onde hoje está a avenida Daniel Comboni; No alto da foto a sede do Incra ao lado da Serraria; bem mais acima está a BR-364 saída para Ji-Paraná
Mingonga, o ‘bicho-papão’
O seringalista Vicente Saborá Cavaltante e dona Nami tiveram quatro filhos: Raimundo, Airton, Ari e Adeilton. No início da década de 60, dona Nami acabou adotando um recém-nascido cuja mãe havia morrido no parto. O pai da criança era Francisco Pereira Maia, o Mingonga, um soldado da borracha vindo de Aracati/CE, que tornou-se alcoólatra pelo desgosto da morte da mulher. Esse menino adotado é Elias, que ficou com o sobrenome do seringalista – Medeiros Cavalcante. Mais tarde se tornou maratonista. Ele tinha dois irmãos mais velhos, Deco e Francisco Júnior, o Chiquinho. Pensa num cabra cobra de sinuca! Os dois foram embora de Ouro Preto e 1975. Mingonga, devido a bebedeira, tornou-se o bicho-papão das crianças da época. Quando um garoto fazia bagunça, as mães diziam que chamariam o Mingonga. Os detalhes desta história foi o próprio Mingonga que me contou. Ele carregava água para abastecer os tambores de um restaurante que a minha família tinha, em 1975. Aliás, ele vivia de bico fazendo serviço ali e aculá para os comerciantes. Em 1982, Mingonga morreu atropelado na BR-364 próximo onde hoje é o posto do Alex Testoni. Ironia do destino é que, os irmãos Miranda Gil e Mariano, o Cuiú, que ajudaram a socorrer Mingonga, morreram de cirrose hepática. A terceira pessoa que também o socorreu, Adnaldo de Jesus, o Nadinho, foi assassinado entre Jaru e Ouro Preto em 1999. (Que sorte a minha, ajudei a socorrer o Mingoga e estou aqui para contar a história). Ah, estava me esquecendo do cerealista Gentil Ferreira Lima, que também está vivo. Ele foi quem levou Mingonga ao hospital na carroceria do carro dele, uma D-10. Na praça dos Migrantes, a imagem de Mingonga está esculpida em uma tora de madeira. O trabalho foi feito pelo artesão Toninho Geraldo, que não mora mais em Rondônia.
Vista aérea do Incra: campo de futebol; no alto da foto, do outro lado da estrada ficava a vila Sapolândia
Internato para alunos do sítio
Ao lado da Sapolândia, onde foi o parque de exposições de Ouro Preto, foram construídas seis casas. Numa delas morava Adhemar da Costa Sales. Outro vizinho dele era Valter, motorista de caminhão de toras. Nas outra quatro casas, não me recordo o nome dos moradores, mas uma dessas casas foi transformada no primeiro internato de Ouro Preto. Filhos de agricultores passavam a semana no internato para estudar e aos fins de semana retornavam para o sítio. Isto aconteceu em 1972, até que no mesmo ano, foi construído um internato maior onde hoje funciona o Centro Supletivo de Ouro Preto Professor Antônio. Nesse internato moraram Jórmis César Fernandes da Rocha, advogado e pastor da Assembléia de Deus; Irlei Salomão (pecuarista), Hamilton Soares Lenk (Pecuarista), Arlene Amaral Jacob, Maria Rosa, a Lica, (professora em Ji-Paraná), Heber e Elizabete, da família do Tatão Pedro; Os Irmãos Ronaldo e Roberto Borges Lima; Inês Castro Zanol; Gélia Batista Pires; além das professoras a advogada Maria Anna Silva Costa, ( que hoje é empresária em Jaru – esposa do Soares que foi um dos primeiros guardas florestais de Ouro Preto), e professora Vilma, que atualmente mora em Ariquemes, casada com Leo Vegildo, um dos primeiros técnicos agrícolas do Incra. As duas eram responsáveis pelo internato. Em 1973, chegou a professora Dirce Maria da Cunha, que assumiu o internato.
Por falar em professora, a primeira no núcleo de Ouro Preto, onde se formou a cidade, foi Rosalina Siqueira do Amaral (ex-esposa do Antônio Acácio do Amaral – atualmente sindicalista, um pioneiro em Ouro Preto). A segunda chamava-se Maria Vilany da Silva (in memoriam – que era esposa do mecânico do Incra Aldemi Ferreira da Silva, também in memoriam). A terceira professora foi Maria Judeci seguida de Maria da Luz. Mas a primeira professora de fato, atuou na zona rural de Ouro Preto, que começou bem antes da chegada do Incra: foi dona Síria Amaral Jacob – ela lecionava próximo ao rio Boa Vista, km 31. A segunda professora da zona rural foi dona Dezinha, que era esposa do motorista Pará, ambos moravam próximo à esquina da linha 22 da BR-364. Lá havia um depósito de sementes de seringueira da Superintendência da Borracha (Sudhevea). Aliás, eu estudei naquela escola seis meses porque em Ouro Preto não tinha série que eu precisava. Viajava todos os dias de Ouro Preto ao km 22 no Jaboti. Era um ônibus adaptado. A frente era igual a de um caminhão, parecido com os tradicionais ônibus escolares dos estados unidos dos anos 50. Não tinha bagageiro e na descida, no pau, dava no máximo 60 km/h. O dono do ônibus era o Cabeça. Não me recordo o nome. Aliás, Cabeça era amigo do Zé Otônio. O trajeto do primeiro ônibus “intervila” de Rondônia saia dos Cabeludos, no Santa Rosa – aproximadamente seis quilômetros de Ouro Preto no sentido Jaru, com destino a Vila de Rondônia cujo ponto final era o Mercado Modelo que recém havia começado. O mercado Modelo não existe mais. No local foi construído o Teatro Dominguinhos. Santa Rosa era um núcleo do Seringal dos Cabeludos. Cabeça morreu após tombar num Jeep sem capota na Vila de Rondônia. Por coincidência, foi Zé Otônio, hoje vice-prefeito de Ji-Paraná, quem ajudou a socorrer o amigo.
Na foto aparecem os alunos Juscilei que era filho do padeiro; Eudes Venâncio, cujo pai, seu Inácio tinha um comércio em sociedade com Tezinho; Zélia Dias, filha de João Dias que se tornou deputado; Marinez Rocha, que mais tarde se casou com o colega de escola Marcos Casales Teixeira, ela era filha de Manoelzinho motorista do Incra; Zenaide, filha de agricultor; Hamilton Soares Lenk, filho do Zé Lenk – um dos primeiros pecuarista de Rondônia; Ana Maria Fabilon, filha de agricultor e hoje é professora; Maria Hilda, irmã da professora Maria da Luz; Leci Brandão, filha do Seo Oliveira – irmã de Jaconias e Roldão Lima de Sousa, ambos estudaram nesta escola; Suzete, filha de agricultor e, Clarice, também filha de agricultor. Todo são alunos da sétima série em 1973.
‘Cata-corno’ é o ancestral da Eucatur
Na segunda parte do especial sobre a história da colonização de Rondônia publicada no último domingo, especialmente, onde tudo começou, projeto Ouro Preto, falei sobre o primeiro ônibus que fazia linha no interior pela BR-364. Era o Jabuti – um ônibus com frente de caminhão e carroceria igual aos ônibus escolares dos Estados Unidos dos anos 30. O nome do dono do Jabuti, Cabeça, que foi batizado por Nelson Baracho de o “Cata-Corno”, não me veio à memória. Mas o empresário Zé Otônio (atual vice-prefeito de Ji-Paraná) disse que o nome do Cabeça era Antônio Nogueira de Lima. Ele era sócio do Pedro Rocha, o Pedrinho. O trajeto do Jabuti ou Cata-Corno, era do Santa Rosa à Vila de Rondônia tendo como ponto final o Mercado Modelo, que ficava onde atualmente é o teatro Dominguinhos em Ji-Paraná.
Naquela época eu pegava o Cata-Corno todos os dias em Ouro Preto e ia para o quilômetro 22 para estudar numa escola que não existe mais. Em Ouro Preto não havia a série que eu frequentava, então passei a estudar com a professora Dezinha.
Certa vez tive que ir até a Vila de Rondônia. Minha mãe, dona Gladys, havia me dado a tarefa de fazer algumas compras. Como naquele dia não havia aula, fui ao mercado modelo fazer compras no Mercado Gaúcho: ficava na avenida Marechal Rondon bem na esquina que dava de frente a casa do seringalista Valmar Meira. Aliás, ‘seo’ Valmar era amigão do meu pai – Agenor Nogueira da Rocha. Sempre que eu vinha para a Vila de Rondônia, filava uma ‘boia’ na casa do Valmar. Sempre bem humorado e de cabelo com corte ao estilo alemão, era uma pessoa formidável. Ele me chamava de Robertinho – o filho do Dragão. Meu pai tinha o apelido de dragão porque ele era operador de escavadeira Dragline, mas essa atribuição profissional foi na década de 50, no Acre.
Deixa eu voltar a o episódio do cata-corno. Bem, quando estava retornado para o projeto Ouro Preto, na fila de cadeiras ao meu lado, havia dois senhores aparentando ter 60 e 65 anos e, na cadeira de trás deles, estava Jabiraca. Ele era jogador de futebol e morava em Ouro Preto.
De repente, Jabiraca faz um cigarro de papel e acende. O cheiro logo chamou a atenção dos dois homens. Eis que um deles indaga: – Moço, que fumo cheiroso é esse? Jabiraca, sem pestanejar, inventou uma história que se tratava de uma encomenda que tinha feito de um tio no Mato Grosso, e acabou fazendo uma porronca do tal fumo e deu pros velhinhos. Quando chegou nas proximidades da ponte sobre o igarapé Miolo (atualmente o limite entre Ji-Paraná e Ouro Preto) os velhinhos estavam numa felicidade. Contaram causos e ainda cantaram moda de viola. Assim que o cata-corno parou em frente à Cantina do Capitão Silvio de Farias, à direita, bem na entrada do projeto Ouro Preto, nós descemos do ônibus. Eu perguntei ao Jabiraca que diabo de cigarro era aquele que deixou os velhinhos eufóricos? Jabiraca riu, desconversou e disse que era um baseado. O cabra deu maconha pros velhinhos! Os velhinhos desceram do cata-corno na altura onde hoje é a linha 37. Nunca mais os vi.
Sendo assim, posso afirmar categoricamente que o Cata-Corno do Cabeça é o ancestral da Eucatur em Rondônia.
Os ônibus que faziam linha nesta região de Cuiabá a Porto Velho era viação Mota e a viação Mato Grosso. Com não havia cidades na época, os ônibus passavam nas localidades buzinado pois o sistema para pegar passageiros era o pinga-pinga.
Chegada de primeiros colonos que montavam barracas e aguardavam a indicação do Incra para ocupar a terra
Acampamentos do Miyache e do Machado
Dois acampamentos foram fundamentais para a abertura das linhas vicinais de Ouro Preto. Eram os acampamentos do Machado e do Miache.
Manoel Renato Machado e Jonas Monteiro era sócios do acampamento de topografia que prestava serviço para o Incra em 1970. Um pouco mais atrás estava o acampamento do Antônio Miyache. A localização exata desses acampamentos era onde hoje fica a Fum Hose, que também foi uma área da Aninga nas décadas de 80 e 90.
Mais de 40 homens se dividiam nos dois acampamentos. Personagens como Raimundo Nonato Garcia Neto, Francisco Robercilio Pinheiro, Pedro Boeiro, Flávio Costa de Meneses, Agenor Nogueira da Rocha, Joel Lopes ( que no fim da década de 70 desapareceu em um avião com Manelão, esposo da dona Lucimar, cujo avião nunca mais foi encontrado), Zeferino dos Santos, Raimundo Caribamba, Enoque dos Santos, Gilberto Pereira, Francisco Capixaba (o caçador) Comara – que era tratorista, são personagens da epopéia de desbravadores que se tornou a abertura das primeiras estradas vicinais de Rondônia.
O topógrafo Zeferino era um crioulo de 1,90 de altura e protagonizou um dos episódios mais hilários da história da colonização. Na época eu tinha 11 anos de idade, quando, no acampamento do Miache, Zeferino foi pivô da gozação dos amigos porque eles haviam se encontrado com uma tribo de índios. Zeferino era muito engraçado, porque não escondia que era um medroso de marca maior. Os índios se aproximaram da equipe de topógrafos, no meio da mata, levaram o material da equipe, mas, o detalhe estava justamente na curiosidade dos índios com relação ao Zeferino. Como ele era preto do branco do olho rosado, os índios passavam a mão na pele do Zeferino para saber se aquilo era pintura. Depois os índios colocavam o dedo na boa e cuspiam. (sinal que não gostaram do sabor). No fim da história, todos voltaram vivos. Aí, o gaiato do Francisco Capixaba, o caçador, para amedrontar ainda mais o Zeferino, dizia que a onça prefere comer preto. “Se tiver 10 pessoas dormido, a onça vai direto ao preto e leva pra comer”, comentou Capixaba. Por conta disso, Zeferino acabava dormindo nos acampamento do meio da mata no meio dos outros – sempre preocupado com a onça. Aliás, em Ouro Preto havia onça demais. Nos mês de outubro, quando elas entravam no cio, escutávamos estrondo delas próximo ao acampamento.
Tragédia marca início da colonização
Maio de 1971. Um helicóptero que partiu do Rio de Janeiro com dentinho a Rondônia caiu e explodiu na região de Três Marias, Mato Grosso. Na aeronave estavam o piloto Sidney Girão e o mecânico de avião Francisco Maurício Seixas. Há um mês do acidente, os dois haviam saído do Projeto Ouro Preto, em Rondônia, a caminho do Rio aonde o helicóptero passou por uma revisão. Eles estavam de volta para o Projeto Integrado de Colonização.
A tragédia causou comoção. Naquela época, engenheiros, técnicos agrícolas, guardas florestais, topógrafos, motoristas e demais funcionários do Incra formavam uma grande família de brasileiros de várias partes do Brasil que aceitaram o desafio de desbravar a região inóspita: o Projeto Ouro Preto, cujas terras no passado pertenciam a seringalistas e que foram readquiridas pelo governo de Emílio Garrastazu Médici. Em 1970, de Pimenta Bueno à Velha Ariquemes havia duas ou três centenas de famílias remanescentes de soldados da borracha e de garimpeiros da era da exploração do garimpo de diamante no rio Machado que fincaram raízes.
Em homenagem às duas vítimas da explosão do helicóptero, o Projeto de Colonização próximo a Guajará-Mirim foi dado o nome de PIC Sidney Girão. O PIC deu origem ao município de Nova Mamoré. À primeira serraria do Incra em Ouro Preto foi dado o nome de Francisco Maurício Seixas. A serraria não existe mais. Maurício era fã do Tim Maia.
Pico-de-jaca revela ateu convicto após salvamento
Em 1970 Sidney Girão recebeu um chamado para socorrer um garoto, filho de parceleiro que havia sido picado por uma cobra pico-de-jaca. Se não me falha a memória, o fato se deu na altura do quilômetro 28 da Linha 81 que, na época, só havia avançado na abertura da estrada uns seis quilômetros partindo da BR-364. O pai do garoto apareceu por volta das 9 horas na sede do Incra pedindo por socorro. Na época, o Incra mantinha um helicóptero à disposição para dar assistência aos trabalhos de demarcação na selva. Em 1973 o heliporto chegou a ter seis helicópteros locados de uma empresa do Rio de Janeiro. Pois bem, Sidney foi à demarcação do agricultor e levou garoto para Porto Velho, ao Hospital São José (hoje não existe mais – ele ficava na rua Almirante Barroso e, aos fundo, pro lado da Sete de Setembro, ficava o colégio Maria Auxiliadora). Por sorte, o garoto sobreviveu e Sidney acabou levando o garoto até a demarcação. A mãe do adolescente ficou grata demais e acabou dizendo: seu Sidney, que Deus lhe pague! Sidney olhou pra ela e disse: – Deus não, minha senhora. Deus não vai me pagar nada e nem precisa passar essa dívida pra ele. A senhora também não me deve nada, mas, se um dia tiver oportunidade, faça algo igual por alguém que necessitar.
Sidney Girão era ateu. Foi ele quem me deu os livros Eram Deuses os Astronautas (do escritor suíço Erich von Däniken) e Dom Quixote de la Mancha, do escritor Miguel de Cervantes.
Primeiro ganhador da Loteria Esportiva
Com a realização da Copa de 1970, que o Brasil acabou conquistando o tricampeonato mundial de futebol de campo no México, a Caixa Econômica Federal lançou a Loteria Esportiva. O Volante de apostas era composto de 13 jogos e quem acertasse os 13 jogos, ou seja, fizesse 13 pontos, ganhava uma bolada. Era algo tão valioso como a Mega-Sena de Hoje. De repente, eu estava na varanda da minha casa, que era um restaurante – a pensão da Dona Gladys, minha mãe – e chega o guarda Florestal Agostinho Peniche Bernardes. Um carioca, que na época era solteiro, feliz da vida porque havia acertado na Loteria Esportiva. Ah, a pensão da Dona Gladys, que ficava na vila Sapolândia, em Ouro Preto, foi o primeiro restaurante de lá. Os funcionários do Incra e da Ceplac que não tinham família, faziam refeição lá minha casa, a pensão.
Pois bem, Peniche ficou numa felicidade só. Até pagou cerveja, depois pegou uns trocados emprestado e foi para a Vila de Rondônia pegar o avião da Taba. O aeroporto na época ficava onde hoje é a avenida Ji-Paraná, no Bairro Urupá. Ao chegar a Cuiabá, Peniche, que é torcedor do Bangu – um time da segunda divisão do Rio de Janeiro – teve a confirmação de que realmente havia acertado na Loteria Esportiva, mas não foram os 13 pontos e sim, 12. O problema é que o concurso teve muitos acertados e o dinheiro que ele ganhou sequer deu para pagar a passagem de avião de volta. Coitado do Peniche, achou que estava milionário e teve que retornar para Ouro Preto de ônibus – pela Viação Mota. Pior, devendo um bom dinheiro que havia gastado por conta do prêmio.
Peniche chegou a Ouro Preto no segundo semestre de 1970 como guarda Florestal. Ele veio com mais dois Guardas Florestais também cariocas: Amaurino Raimundo e Carlos Alberto Soares, que atualmente é empresário e pecuarista em Jaru.
Dois anos mais tarde, Peniche se casou com a filha de um parceleiro. Foi candidato a prefeito e não se elegeu. Tornou-se empresário e hoje mora em Rio Branco, onde tem uma distribuidora de medicamentos.
Peniche e Soares montaram o primeiro time de futebol do Projeto Ouro Preto. Era o Banguzinho – uma homenagem ao Bangu carioca que ambos são torcedores. Acho que são até hoje os únicos dois torcedores do Bangu que moram em Rondônia.
queria saber como faz para visualizar as fotografias do texto
Parabêms meu amigo Roberto Gutierres. por essa bela história do nosso municipio, eu era muito criança nessa época mas lembro do comandante LACERDA era piloto do helicoptero do incra, era muito reservado mas era amigo do meu pai OTAVIO PELUTTI DA MAQUINA PARANA.
Sim. Eu o conheci. Tanto teu pai como comandante Lacerda. Os filhos dele (Larceda) eram meus amigos.
Roberto, salvo engano, o Gil tinha um irmão cujo o apelido era Cheirinho que falecera de malária pelos idos 71/72.
Pena também que chegamos mais o menos nessa época 1975 recorda de muitas coisa que vc mostrou !
Parabéns Roberto por este lindo texto….Amei, este inicio de ouro preto eu não conhecia com riqueza de detalhes. Vc parou justo no ano que cheguei, Fiquei curiosa, vamos colocar o cérebro pra funcionar. Tenho certeza que dará um belo livro. Foi muito bom
Queria saber se lembra do meu pai Valadares Barbosa de Oliveira. Trabalhava no Incra.
Lembro. era técnico agrícola. era conhecido com Barbozinha. Era nordestino. Namorou com Arlene Amaral Jacob. Foi embora de Rondônia ainda na década de 70. estou escrevendo um capítulo sobre os técnicos agrícolas que iniciaram com a chegada do Incra.
Roberto se não me engano Valadares Barbosa de Oliveira não era o Barbosinha. Valadares é irmão do Lacerda, do Lindemberg. Barbosinha se casou com Rosilda filha do Valdevino que morava ali onde era o cacau lanches próximo ao CENTRER.
Nossa, gostei muito do que li. Cheguei em 1980, então a história também é minha. Quero continuar lendo os próximos textos. Parabéns Roberto.
Em Breve vou postar mais textos. os que estão aí, na verdade, revelam um período de 1969 – 1970 a 1975. ainda tem muita coisa. estou preparando. refrescando a memória – uma narrativa de quem viveu essa história com o olhar de um adolescente. a década de 1980 tem fatos pitorescos – muita coisa interessante. Muito Obrigado por prestigiar nosso trabalho.
lndo lindo mu amigo parabens pra vc por isso eu digo grande gerreiro
Às vezes, precisamos apenas de um aroma, um trecho de música, o pronunciar de uma expressão ou uma fotografia para desencadear um monte de lembranças. De repente, isso nos pega de surpresa e nos emociona. Em especial se o momento atual for de dificuldade ou se o momento em que o passado vem à mente nos leva a entender que, para ser feliz, não é preciso muito, mas o verdadeiro, o simples e que éramos jovens. Assim é a vida: enquanto houver lembrança ou formos lembrados, estaremos vivos.
* parabens a vc ROBERTO GUTIERREZ por ter essa lembrança da história e começo de ouro preto do oeste, vejo nees foto onde moro hoje, e vejo la no cantinho a foto do campo incra de futebol, a velho incra , vamos lançar uma campanha para restauração do incra e entregar a população desportista, pra lembrar como iniciou a cidade de ouro preto, sr DEPUTADO FEDERAL CARLOS MAGNO, VC QUE SAI NA POLITICA COMO CARLÃO DO INCRA E JOGOU FUTEBOL NESTE CAMPO OLHA AI E VE O QUE DA PRA FAZER É ANO DE ELEIÇÃO…O QUER VER A REALIDADE QUE NÃO ACONTECE…
Grande jornalista Roberto Gutierrez, parabéns pelo belo texto sobre a memória histórica da amável Ouro Preto do Oeste, cuja história é objeto de estudos e paixão de muita gente… A EEEFM Joaquim de Lima Avelino se sente honrada da lembrança, como professor da mesma, levarei ao conhecimento dos alunos o vosso texto, muito rico e oportuno… Muitas esperanças !!!!!
maravilhoso voltar ao túnel do tempo parabens jornalista Roberto
Sinto-me lisonjeado por ter sido útil o que escrevi. Estou com uma série de pequenos textos, como se fossem retalhos da história, numa narrativa simples, mas cheia de detalhes. Em breve vou disponibilizá-los Caso queira, pode me convidar para conversar com teus alunos dessa escola que já foi mim, quando o adjetivo dela era Isolada – Doutor Joaquim de Lima Avelino, que, aliás, na época, ninguém sabia quem era. .
Sinto-me lisonjeado, professor, por ter sido útil o que escrevi. Estou com uma série de pequenos textos, como se fossem retalhos da história, numa narrativa simples, mas cheia de detalhes. Em breve vou disponibilizá-los Caso queira, pode me convidar para conversar com teus alunos dessa escola que já foi mim, quando o adjetivo dela era Isolada – Doutor Joaquim de Lima Avelino, que, aliás, na época, ninguém sabia quem era. .
Meu caro Roberto cheguei em Ouro Preto 1975 e sei do que você está falando. São memórias que ainda estão guardadas apenas numa pequena parcela de sobreviventes. O Juscilei que você meciona, filho do padeiro, mora em Ariquemes é trabalha na Rondobras pneus.
Conheci muita gente que está mencionada no texto. Também lembro do Juca da comercial paranaense. Outro é o seringalista paca assada. O Salu também veio a minha memória.
Parabéns Roberto!
E meu amigo vc me fez volta ao passado….abraço do seu amigo corujinha…..
Sinto muita saudade desse tempo……..
Grande Edvan. Para quem não sabe, o pai do Edvan, é Raimundo da Cruz Teixeira, o Coruja, primeiro motorista de ambulância do Projeto Ouro Preto. Ele hoje é nome de rua.
Caro amigo você me fez lembrar de um tempo distante. Do meu passado distante. De um tempo que Outo preto era sem dúvida muito mais bonito do que hoje. Quando cheguei a ouro preto em 1975 estudei nessa escola. Conheci o Mingonga, o Gil, o Mariano, e eles também tinham um outro irmão. Admirava os Helicópteros do Incra.
Mariano, Antônio, Pedro, Ametista todos eles assinam Gil – são irmãos. Aliás, foi o Mariano, o Cuiú quem da família chegou primeiro. Pedro Gil veio logo em seguida, questão de dias. Muita gente fala besteria demais quando se refere a história de Ouro Preto.Sinto-me na obrigação de escrever, caso contrário isso tudo vai morrer com a gente e, daí, vão escrever aquilo que a imaginação deles achar que poderia ser.